sábado, 26 de setembro de 2015

Refugiados: uma caravana, o rosto de Deus e um desenho de um mapa


Sexta à noite em Lisboa: o grupo de voluntários que decidiu 
partir para a Croácia, para trazer famílias de refugiados

Doze pessoas e seis automóveis estão já em Barcelona, por esta altura, depois de, ontem ao início da noite terem saído de Lisboa. Amigos e desconhecidos quiseram contribuir para a viagem, enchendo as malas com roupas e cobertores, cadeiras de bebés, comida, medicamentos e outros bens.
Hoje, o grupo conta dormir algumas horas em Montpellier, já em França.
Na Visãoque acompanha a caravana, há já uma primeira crónica da viagem.
De resto, a viagem pode ser acompanhada por quem está no facebook, na página Famílias como as nossas.

Sobre a questão dos refugiados, Rosário Gamboa escreveu há duas semanas, no JN, numa crónica que vale a pena ler:
Deslocados, perdidos no mar ou amontoados nos comboios, estão os rostos que evitamos ver porque temos medo - medo da nossa profunda vulnerabilidade; de perdermos as certezas que construímos sobre nós e sobre os outros.

Também na sua página de Facebook, Alfredo Abreuresponsável do Serve The City Lisboa escreveu há uma semana um testemunho que vale a ler:

Faz hoje 40 anos. Eu tinha 13 na altura e chegámos a Portugal a 17 de Setembro de 1975. Muitas outras pessoas ficaram para trás, dias e dias no aeroporto à espera de poderem entrar num dos aviões da ponte aérea. Vínhamos a fugir de uma guerra que vi (e ouvi) fazer-se na nossa cidade, de facto até bem à frente da nossa casa. Chegámos com as malas que trazíamos. Éramos refugiados. Muitos, muitos, muitos milhares. Esta era uma terra e uma cultura diferente da que conheci toda a minha vida. Nem sempre fomos bem recebidos por quem tinha medo de virmos retirar espaço, empregos, sei lá que mais. Mas o espaço foi-se abrindo, para uns mais do que para outros e hoje já tudo parece uma memória longínqua.
No primeiro ano de escola aqui em Portugal fui chamado à atenção pelos professores por não estar a prestar atenção. Desenhava incessantemente o mapa de Angola. Vivemos em família (muito) alargada num pequeno apartamento durante alguns anos. Durante muito tempo os carros com matrículas de Angola e Moçambique faziam sinais de luzes quando passávamos uns pelos outros. Havia saudade e muitas incertezas: já não éramos de lá e ainda não éramos daqui...

Hoje este é o meu país, a minha terra, aqui tenho investido o melhor que sei e posso. Modesta mas convictamente tenho procurado contribuir para o progresso de Portugal, demos-lhe 4 filhos, não tenho dúvidas que Portugal ficou mais rico. 40 anos depois não posso deixar de ver a chegada de mais refugiados com expectativa muito grande, pensando nos que vêm provavelmente até sem malas, mas com uma história que pode tornar a nossa ainda mais rica. Estou pronto para receber os nossos novos vizinhos. De braços abertos, de coração aberto, para construirmos uma Cidade mais justa, fraterna e solidária. Juntos.

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