terça-feira, 5 de março de 2013

''O novo papa deve dedicar-se à realização de reformas''
Entrevista com o Cardeal Walter Kasper

Damos aqui a conhecer, via newsletter do Instituto Humanitas Unisinos, do Brasil, o trabalho de Paul Kreiner, publicada no sítio Diepresse.com, no passado domingo, dia 3 (tradução de Moisés Sbardelotto).
Entre os eleitores do papa, ele é o mais idoso. Se o Papa Bento XVI houvesse se retirado somente cinco dias mais tarde, as portas não teriam se aberto para Walter Kasper. Nessa terça-feira, 5, ele completa 80 anos de idade e supera, assim, o limite de idade. Justamente neste ano, por causa da preparação e dos encontros em vista do conclave, viraram fumaça os festejos pelo seu 80º aniversário. "Já estava tudo preparado... Me desagrada um pouco", diz ele.

Mas, por outro lado, há também o aspecto positivo: "Poder votar novamente, ser chamado mais uma vez à responsabilidade". O cardeal alemão quer utilizar ativamente essa oportunidade: "Para fazer uma contribuição, dentro do possível, para uma passagem positiva de um pontificado para outro".

Durante a conversa que tivemos na sua casa pouco antes da sua entrada no Vaticano, não se nota a idade de Kasper. Ele fala do papa que se retirou, que "com as suas palavras foi mais escutado do que parece", que entrará na história da Igreja seja "como grande teólogo", seja pela sua renúncia. Esta "não mudou a essência do papado, apenas lhe deu um novo rosto": "Foi tirada do papado uma certa aura sagrada. Uma pessoa que diz que não tem mais a força para o próprio cargo merece respeito".

Dizendo se sentir fraco, Bento XVI queria dizer aos cardeais, com a sua retirada, que agora eles devem escolher uma pessoa jovem e forte e, portanto, se preparar desse modo para um novo longo pontificado? "Bem, é preciso ter bastante experiência para ser chamado ao pontificado e também uma certa sabedoria dada pela idade. E deveria estar acima das partes, para evitar fissuras. Mas alguém de 60 ou 70 anos ainda tem força suficiente. Essa seria a idade apropriada".

Pessoalmente, Kasper diz: "A meu ver, não é tão importante a idade, nem mesmo nacionalidade. O que conta muito é a personalidade". E como é possível descobri-la? Os cardeais se conhecem suficientemente?

"Esse é precisamente o objetivo dos encontros pré-conclave. Não são encontros para conversas de bastidores, como muitas vezes são representados, não se fazem acordos, que além disso são proibidos. Falamos uns com os outros, nos conhecemos – também em nível não verbal – e começamos a ter uma ideia uns dos outros. É um modo de proceder humano muito normal para chegar a uma decisão". Também por isso, diz o cardeal, "eu não concordo em antecipar o conclave demais. Conhecer-se reciprocamente requer tempo. Não se deveria precipitar a eleição do papa".

Centro de gravidade deslocado

O que o novo papa deve ser capaz de fazer? "Ele não pode ser apenas um administrador, deve ser uma pessoa com profundidade espiritual, um pastor. Deve guiar a Cúria e a Igreja universal. Deve se dedicar à implementação de reformas que – e vemos isso desde agora – são necessárias em ambas as áreas".

Começando pelo aspecto global: "A Igreja se tornou uma Igreja universal de uma nova forma, o seu centro de gravidade se deslocou para a parte Sul do planeta. A questão da unidade e da multiplicidade deve ser repensada". Certamente, continua Kasper, "ter um papa é uma força da Igreja Católica, um centro. É um dom do Senhor. Mas ter um centro não deve significar absolutamente centralismo. São necessárias reflexões urgentes".

Kasper propõe que se conceda "uma maior autonomia a unidades continentais ou culturais... em âmbitos que não digam respeito à fé". Ele esteve recentemente na Coreia: "É um mundo totalmente diferente. Os teólogos e os bispos de lá nos dizem que nós, em Roma, não os entendemos. É claro, não podemos compreendê-los totalmente com a sua história e a sua cultura tão diferentes. Por isso, eu diria: a unidade é importante, mas em uma leal multiplicidade".

E quanto é possível ser indecente dentro da Cúria, dados todos os relatos e as suposições? "Eu não sei o quanto são verdadeiros os relatos, especificamente. Mas há fenômenos que me preocupam profundamente, corrupção, coisas que têm a ver com a sexualidade, aspirações de carreira e de poder. Bem, podemos dizer que são fenômenos muito humanos, mas que não deveriam existir na Cúria, ou deveriam existir de uma maneira sensivelmente inferior a outros ambientes. Esse é o motivo da necessária reforma da Cúria que eu espero". Para a qual, no entanto, o novo papa também precisa de "força de vontade e de resistência": "Não se pode simplesmente dizer: a partir de amanhã vamos fazer diferente. Ele também deve se impôr".

E as outras questões pendentes? "A primeira é uma questão fundamental do mundo ocidental de hoje: como posso testemunhar o centro da fé cristã de modo que toque o coração das pessoas?". E depois: "O que vai acontecer com relação à Fraternidade de São Pio X? E com as demandas de caráter pastoral, como a fusão das paróquias, o ecumenismo e sobretudo: o que vai acontecer com relação aos divorciados em segunda união? A lista de problemas é longa. O novo papa não poderá abordá-los todos imediatamente. Deve estabelecer prioridades e depois dar um passo de cada vez".

Um especialista em ecumenismo

Justamente sobre o ecumenismo, Kasper, como especialista nesse âmbito, espera que o próximo papa "não diga só o que não está certo, mas que nós façamos ofertas e propostas positivas". O problema, de fato, diz ele, é que "os parceiros do diálogo têm uma visão diferente da Igreja e, por isso, também uma forma diferente de entender o que deve ser a unidade na Igreja".

Nisso, um novo papa poderia contribuir muito. Também através de um exercício diferente do seu cargo, mediante – justamente com referência aos ortodoxos – um "fortalecimento da estrutura sinodal, seja em nível de Igreja universal, seja de Igrejas locais".

E o que faz o cardeal Kasper, agora que se aposentou? O que deseja para o seu aniversário? "Como cardeais, não nos aposentamos. Enquanto se possa fazer alguma coisa, é preciso fazê-lo. Eu me sento à minha mesa, e com as publicações ainda é possível influenciar um pouco a Igreja. Mas vou reduzir o ritmo intenso das viagens dos últimos anos".
(Crédito da foto: Max Rossi/Reuters)

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