domingo, 17 de fevereiro de 2013

Uma diáspora ibérica




Os Sete Lágrimas são um caso raro no panorama da música em Portugal. Executando peças antigas e contemporâneas num diálogo vivo e original entre o passado e o presente, entre o erudito e o popular, entre o português e o universal, o grupo soube impor a qualidade e o sucesso nos vários discos editados desde 2007 – e, com este, já são oito. 

“Diáspora” é o título de um projecto dos Sete Lágrimas, do qual este “Península” constitui o terceiro volume. Nos dois anteriores (“Diáspora.pt” e “Terra”), o grupo mostrou-nos a música do mundo que reflecte o contacto com a cultura portuguesa nos últimos cinco séculos.

Agora, os Sete Lágrimas oferecem-nos um conjunto de 16 peças, retiradas do repertório ibérico dos séculos XVI e XVII – e incluindo cinco compostas especialmente pelos dois directores artísticos e vozes do consort (Filipe Faria e Sérgio Peixoto), a partir de textos daquela época. Desde o intenso “Parto triste saludoso” com que se abre o disco, até ao compassivo “Porque lhoras moro” ou ao declamativo “Ay que biviendo no byvo”, essas cinco criações são de uma harmonia ímpar, a revelar também a excelente criatividade compositiva dos dois artistas. Se à música e às vozes somarmos a mestria da execução instrumental (Pedro Castro, Sofia Diniz, Duncan Fox e Rui Silva), temos um excelente resultado final.

Os textos, de grande beleza literária, traduzem ainda o grande cuidado posto no processo de selecção. Falam-nos de amores e desencontros, de contentamentos e melancolias, de afectos e zangas. Como em “Um cuydado que mia vida ten”: “Minha vida um cuidar tem, que não o saiba ninguém. Um cuidar de minha querida, Que a alma tem, e ao corpo dá vida. Meu corpo o sente, minh’alma o tem, que não o saiba ninguém.”

Diáspora – Península
Sete Lágrimas
Direcção de Filipe Faria e Sérgio Peixoto
Edição: Arte das Musas (mail@artedasmusas.com)

(Texto publicado na revista Além-Mar, em Fevereiro de 2013)

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