domingo, 20 de novembro de 2005

O que é o diálogo?

Do livro
A BRIDGE TO
BUDDHIST-CHRISTIAN DIALOGUE
, de Seiichi Yagi e Leonard Swidler:
"When we talk of dialogue today we mean an intellectual, spiritual encounter between two or more persons or groups that is different from what these encounters usually have been in the past. In the past they were confrontation, argument, debate, subjection, convert-making, or the like. In brief, each of us came to the encounter from a position of assumed superiority; we came not to learn but to teach-because we had the truth, and to the extent the others differed from us they were in error: Such, in large measure, has been the history of the past encounters between religions and ideologies1. That, however, is not what is meant today by dialogue. Rather, dialogue is an encounter between two or more persons or groups of differing views with the primary purpose of learning, not teaching. I come to dialogue with my partner not from a position of assumed superiority in the matter under discussion, but rather I come as one who hopes to learn from my partner, and change, reorder my life accordingly. Precisely here is the essential difference between dialogue and all other types of intellectual, spiritual encounters."

quarta-feira, 16 de novembro de 2005

"Nova evangelização: confissão de uma perplexidade"

Respigo de um texto do jurista e deputado do PSD Paulo C. Rangel um texto vindo a lume no Público de hoje, que começa por considerar
"Um dos grandes acontecimentos culturais dos últimos anos foi, sem dúvida, o Congresso Internacional para a Nova Evangelização, que a Igreja de Lis­boa acaba de acolher e organizar. Trata-se de um marco na nova atitude cul­­tural e pastoral da Igreja Católica portuguesa, só possível devido ao carisma de D. José Policarpo (...)".
E apresenta um dos seus motivos de perplexidade:
"A procissão - nomeadamente pela sua inumerável adesão - constitui uma afirmação inquestionável de presença da Igreja na cidade. Presença im­pres­sio­nan­te, devendo suscitar, como pacificamente parece ter suscitado, o res­­peito geral pela fé e pela cren­ça de cada um e pelo direito a manifestá-la no es­­paço público. Pre­sença que, sem considerandos de oportunidade pastoral e ambiente teológico, se­guramente se mostra útil. Útil, numa sociedade como a por­tu­guesa, onde uma larga maio­ria de cató­licos é relegada para um oprimente silenciamento mediático. Útil tam­­­­bém, por­que frequentes vezes se esquece e se esconde o respeito e a to­le­rân­­cia com que essa larga maio­ria assiste, quoti­dia­namente, à publicitação maciça de concepções e opiniões alternativas ou até contrárias às suas. Um sinal paradoxal, todavia. Paradoxal, porque a linguagem e a ordem sim­­­­bólica daquela manifestação religiosa - por mais ternura e afeição que pos­sa congraçar ­- parece aquém do ambiente e da oportunidade da "nova e­van­­ge­li­za­ção". Parece, aliás equivocamente, fazer convergir a dinâmica e o apelo mís­­­­tico de Fá­tima com uma conjuntura de crise e de incerteza generalizada. Pa­radoxal, porque a procissão evoca uma tradição mais rural do que urbana, releva mais duma pas­toral do passado do que do futuro e convoca mais uma "confirmação da fé" (ainda que uma fé plural e diferenciada) do que uma "reevangelização". Paradoxal, por­que a lin­gua­gem usada foi estritamente tradi­cio­nalista, pouco apta a despertar os ci­dadãos hoje dispersos, podendo ter tingido a visibilidade e a intencionalidade cardial do congresso. E de pouco valerá um paralelo, que já vi esboçado, com as experiências multitudinárias pro­ta­­go­­ni­za­das por João Paulo II. Estas, mesmo quando fiéis de­positárias de uma conservação da tradição - e é um assumido sobrevivente do chamado catolicismo "pro­gres­sista" que o escreve -, relevavam de uma in­ter­pelante linguagem de pro­xi­midade, de uma simbologia inovadora, de um gesto humanamente cativante. Também aqui o testemunho pode valer mais do que a doutrina.".

terça-feira, 15 de novembro de 2005

Arcebispo de Braga fala da "enorme gravidade" dos incêndios

Leio no Público de hoje:

"O novo presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) e arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga, disse ontem em Fátima que a Igreja deve "recuperar uma catequese sobre a enorme gravidade moral que constitui o acto de pegar fogo à floresta e de estimular a co-responsabilidade de todos, mesmo no momento de denunciar potenciais incendiários".
Jorge Ortiga falava no início dos trabalhos da assembleia da CEP, que decorre em Fátima até quinta-feira. Referindo "algumas realidades que exigem intervenção", o arcebispo de Braga disse que "não podemos ficar alheios ao drama dos incêndios". E perguntou: "Não será necessário voltar a insistir sobre a gravidade de certos pecados, individuais e colectivos?"
Referindo-se às políticas dos últimos anos, o presidente do episcopado afirmou que não é "suficiente a concentração" das estratégias de prevenção ou de acção "nos recursos humanos e materiais". Importa, antes, "ir às causas de natureza cívica e questionar-se sobre as razões do desleixo ou dos actos premeditados". A Igreja, a escola e os meios de comunicação social "têm de insistir na formação duma consciência individual e pública, de um modo permanente" e não apenas na chamada, "de forma muito infeliz", época de incêndios."


Partilho, no essencial desta preocupação de D. Jorge Ortiga. Creio, de facto, ser uma "miséria moral" muito do que vimos este ano: a calamidade dos incêndios ser tratada como normalidade dentro da anormalidade e como se o essencial se reduzissse a um problema de meios de combate (ainda que este seja aspecto importante: "Fia-te na Virgem e não corras!", diz o ditado).
Agora o importante é ser consequente. A Igreja Católica, que tem uma malha fina de presença na sociedade portuguesa - e em certas vertentes, responsabilidades directas - como por exemplo nas festas populares religiosas, em que o fogo de artifício continua a ser queimado por vezes em contextos de grande irresponsabilidade - poderia ter um papel muito especial na sociedade se pegasse a sério neste ponto para o trabalho pastoral de base.

segunda-feira, 14 de novembro de 2005

Notas sobre a "Nova Evangelização"

O congresso que na semana passada ocorreu em Lisboa teve o condão de agitar algumas águas e de colocar sobre a mesa a dimensão religiosa / cristã da vida, pelo menos para aqueles que a acolhem e a vivem.
Pelo que fui lendo e ouvindo, houve iniciativas interessantes e diversificadas nesse Congresso, reveladoras de preocupação com a busca de novas linguagens para dizer e expressar a fé e de pontes com expressões e universos culturais menos cultivados em ambiente eclesial.
Por outro lado, registo que uma procissão de velas com a dimensão e o aparato daquela que percorreu algumas das principais avenidas de Lisboa no fim do sábado passado não tenha originado a cega-rega daqueles que convivem mal com o religioso, sobretudo com o religioso católico e que preferiam, talvez, que tal tipo de manifestações não saísse do perímetro dos tempos. Estou em crer que não terá sido por terem passado a reconhecê-las.
Não gostei nada de ouvir, na Rádio Renascença, durante a procissão, umas comentadoras eufóricas com o convencimento manifestado de que mais ninguém consegue reunir uma multidão como a daquela procissão. Além da ilusão em que a meu ver assenta, tal atitude sugere uma sobranceria irritante inclusive para quem olha com apreço para o que se passou naquela tarde na capital do país.
Ficou-me, por outro lado, uma interrogação que já vem a bailar há bastante tempo e que não encontrou resposta satisfatória naquilo que vi e ouvi (e que reconheço poderá ter estado distante da riqueza do que ocorreu no Congresso). Refere-se justamente ao próprio conceito ou projecto de "nova evangelização". Um cardeal, creio que o de Paris, dizia que a atitude deveria ser a de uma abordagem não apenas para as pessoas, mas com as pessoas. Já é alguma coisa, ainda que me pareça que, no que se ouve e lê, o que perpassa é um processo unilateral, assimétrico, transferencial, de quem tem ou julga que tem (algo a anunciar), para quem imputadamente não tem e que precisa (do anúncio e da matéria anunciada).
Será que não se poderia pensar e propor essa "nova evangelização" de um ponto de vista e numa atitude diversas? Acentuando mais o caminho com as pessoas, todas as pessoas "de boa vontade"? Porque é que a evangelização há-de ser apenas de uns para os outros? Porque é que não poderá passar (muito) pelo escutar, pelo estar? No fim de contas, porque não há-de haver - também - uma acção evangelizadora de sentido inverso, feita a partir dos outros, do "mundo"? Se a mensagem (os apelos, os sonhos, as riquezas, as angústias) que nos chega permanentemente de quem nos rodeia não é escutada e acolhida, acaso poderemos acreditar que esses escutem quem lhes diz que tem para eles uma boa nova?
Perguntas que deixo, suspensas, carentes de contributos.

domingo, 13 de novembro de 2005

Os signos, os rituais e as rupturas necessárias

" (...) em Portugal o contacto de muitos cidadãos com a Igreja acontece, quase exclusivamente, por ocasião do baptismo das crianças, dos casamentos e dos funerais. Aparentemente, estão ali só por conveniências sociais e familiares. Não participam, nem parecem interessados em participar. Mas como é possível que os membros activos das comunidades cristãs deixem passar todas essas ocasiões, ao longo dos anos, sem ter uma estratégia clara de evangelização para esses tempos privilegiados? Quando é que a Igreja se decide a colocar os seus especialistas em ciências humanas, em artes, em teologia e em pastoral - com jovens, adultos e anciãos - a estudar esse fenómeno e a projectar caminhos que superem rotinas que prolongam uma situação que marca negativamente os não crentes, assim como os católicos "periféricos", e não torna evangelizadores os "católicos praticantes"?
"Os sacramentos pertencem à categoria do signo." Não é pela fuga para o dogmatismo - mesmo que ele revista a figura hermenêutica de uma "neo-ortodoxia" - que a fé católica pode manter-se de pé em tempos difíceis. Às vezes são necessárias rupturas, porque o homem, enquanto tal e também enquanto crente, é um ser cultural-histórico. Isto vale para os indivíduos e para os institutos religiosos. Todavia, ritualidade e criatividade não se excluem. Os fiéis não estão colados aos arquivos e aos regulamentos históricos das celebrações rituais de épocas passadas. Um ritual tem o seu contexto.Na prática sacramental e na teologia, temos questões sem resposta suficiente e questões inúteis que não precisam de resposta".
Bento Domingues, in Público, 13.11.2005