quarta-feira, 27 de abril de 2005

"Optimista por opção".

Um novo blogue, da autoria de José Maria Brito, sj. Já foi "haja o que houver", mas por razões que explicou, mudou de nome. Abre com este mote do jesuíta Vasco Pinto de Magalhães: "O contrário da alegria não é a tristeza, é o pessimismo" .
Fé e Política: "A Religião na sociedade Democrática"
Auditório do Colégio São João de Brito (Estrada da Torre, 28 ? Lumiar, Lisboa)
Sábado, 30 de Abril de 2005

Manhã
9.30 ? Acolhimento
10.00 ? Apresentação e enquadramento " A Religião na sociedadeDemocrática" - Hermínio Rico, sj ? Director da Revista Brotéria
10.45 ? Intervalo
11.00 - Painel "Há Lugar para a Religião na vida pública?"
Com: Francisco Sarsfield Cabral/Vital Moreira
Moderador: Pedro Machete
13.00 ? Almoço
Tarde
15.00 ? Painel "Ser Católico na Vida Pública"
Com Maria José Nogueira Pinto/Maria do Rosário Carneiro/Rui Machete
Moderadora: Joana Vasconcelos
16.30 ? Intervalo
17.00 ? Relator Final"Sínteses e Desafios" ? Joaquim Goes
17.30 ? Fim Trabalhos18.00 ? Apresentação do Livro: "P. António de Andrade, sj ? oDescobrimento do Tibete"
Organização: Revista Brotéria
Informações: 21 396 16 60

segunda-feira, 25 de abril de 2005

Desertos interiores e exteriores

"'Existe também o deserto da obscuridade de Deus, do vazio das almas sem consciência da sua dignidade nem do caminho do homem. Os desertos exteriores multiplicam-se no mundo porque se multiplicaram os desertos interiores.'"
Bento XVI, 24.4.2005

terça-feira, 19 de abril de 2005

O que poderá ser um papado de Ratzinger

"Outline of a Ratzinger papacy": escrito por John L. Allen, Jr., correspondente em Roma do National Catolic Reporter, texto escrito antes da eleição.

Homilia de Ratzinger na missa que antecedeu o conclave que o elegeu (extractos):
"Arrêtons-nous seulement sur deux points. Le premier est le chemin vers « la maturité du Christ », comme le dit, un peu en simplifiant, le texte italien. Plus précisément nous devrions, selon le texte grec, parler de la « mesure de la plénitude du Christ », à laquelle nous sommes appelés à parvenir pour être réellement adultes dans la foi. Nous ne devrions pas rester des enfants dans la foi, comme des mineurs. En quoi consiste être adulte dans la foi ? Saint Paul répond que cela signifie être « ballotté et emporté à tout vent de la doctrine » (Ep 4, 14). Description très actuelle !Combien de vents de doctrines avons-nous connu au cours de ces dernières décennies, combien de courants idéologiques, de modes de pensée? La petite barque de la pensée de nombreux chrétiens, bien souvent, a été agitée par ces vagues, jetée d?un extrême à l?autre : du marxisme au libéralisme, jusqu?au libertinisme ; du collectivisme à l?individualisme radical ; de l?athéisme à un vague mysticisme religieux ; de l?agnosticisme au syncrétisme et ainsi de suite. Chaque jour, naissent de nouvelle sectes, réalisant ce que disait saint Paul sur l?imposture des hommes, sur l?astuce qui entraîne dans l?erreur (cf Ep 4, 14). Avoir une foi claire, selon le Credo de l?Eglise, est souvent étiqueté comme fondamentalisme. Tandis que le relativisme, c?est-à-dire se laisser porter « à tout vent de la doctrine », apparaît comme l?unique attitude digne de notre époque. Une dictature du relativisme est en train de se constituer qui ne reconnaît rien comme définitif et qui retient comme ultime critère que son propre ego et ses désirs .
Nous, en revanche, nous avons une autre mesure : le Fils de Dieu, l?homme véritable. C?est lui la mesure du véritable humanisme. Une foi qui suit les vagues de la mode n?est pas « adulte ». Une foi adulte et mûre est profondément enracinée dans l?amitié avec le Christ. C?est cette amitié qui nous ouvre à tout ce qui est bon et nous donne le critère pour discerner entre le vrai et le faux, entre l?imposture et la vérité."
Inverno da Igreja Católica

Há, sempre, que admitir a possibilidade da surpresa. Numa instituição como a Igreja Católica, "o Espírito sopra onde quer" (Jo 3,8), apesar de haver sempre quem queira que ele sopre para determinado lado.
Mas o mais certo é que, em muitos aspectos, a Igreja continue a cerrar fileiras. Em nome de uma luta contra o relativismo entendido como incompatível com a diversidade e a pluralidade no pensar, no sentir e no expressar. É assim provável que, globalmente, nos tenhamos de preparar para um Inverno. É a estação que sucede ao Outono que foi, em certa medida, o pontificado de João Paulo II. O paradoxo do Inverno é que é o tempo em que, vergastadas pela intempérie, curtidas pelo frio, as vergônteas nuas vão ganhando forças para o despontar dos gomos.

segunda-feira, 18 de abril de 2005

Uma Igreja para os nossos filhos
Teresa Martinho Toldy, Teóloga, Professora na Universidade Fernando Pessoa (Porto)
In Público, 18.4.2005

Mais importante do que saber quem será o próximo Papa, é saber o que será a Igreja no futuro. Que Igreja para os nossos filhos? E, em função dela, que Papa para os próximos tempos?

Começa agora o Conclave para a eleição do novo Papa. As atenções de uma parte do mundo estão concentradas em Roma. Os católicos aguardam, muitos, com expectativa, outros, com preocupação. As especulações são muitas. Os "papáveis", ao que parece, também... Tem sido frequente, ao longo da história da Igreja Católica, a eleição de um candidato considerado "improvável" ou nem sequer mencionado. Foi, aliás, o que aconteceu na eleição do Papa João Paulo II.
Partilho esta expectativa, bem como a preocupação. Estou, contudo, convicta de que a Igreja constitui uma realidade e uma experiência que não se esgota na escolha de um Papa para a orientar. É convicção da Igreja que é o Espírito Santo que a conduz. E esta convicção fundamenta um adágio antigo segundo o qual a Igreja é sempre reformável, está em constante processo de evolução, numa tentativa permanente de se aproximar mais da vontade de Jesus Cristo e da experiência fundacional do grupo de discípulos e de discípulas que ele reuniu à sua volta.
Como tal, e, apesar de saber que corro o risco de ser "politicamente incorrecta", diria que, mais importante do que saber quem será o próximo Papa, é saber o que será a Igreja no futuro. Que Igreja para os nossos filhos? E, em função dela, que Papa para os próximos tempos?
Uma Igreja mais humana a Igreja para as futuras gerações deveria ser uma Igreja cuja opção radical pelos mais pobres fosse inquestionável e óbvia, antes de mais, para os próprios excluídos, mas também para os poderosos deste mundo. Esta humanidade da Igreja deveria ser acompanhada de uma atitude de escuta do mundo. Não ficaria mal à Igreja não se colocar tanto na posição de mestra, como na atitude de companheira de caminho de um mundo cuja história continua em aberto. Uma Igreja mais humana implicaria, então, da parte da sua hierarquia e do Papa, a perda do medo de enfrentar e de fazer experiência da existência quotidiana de todos os homens e mulheres deste mundo: o amor, a sexualidade, a paternidade e a maternidade, o trabalho, a intervenção sócio-política, mas também as perplexidades, as angústias, as incertezas, que fazem do ser humano aquilo que o define como simultaneamente próximo de Deus e frágil como o barro. Enquanto a orientação pastoral da Igreja estiver entregue exclusiva ou preponderantemente a pessoas que não fazem esta experiência comum a todos os seres mortais, a Igreja corre o risco de se tornar irrelevante, porque completamente alheia à realidade humana.
A Igreja das discípulas e dos discípulos de Jesus a Igreja para as futuras gerações deveria ser uma Igreja menos centrada em Roma, que abandonasse decididamente uma concepção piramidal - com o Papa no vértice, seguido pelos bispos, estes, pelos padres, e, por sua vez, estes últimos, pelos diáconos - para se converter à concepção de Igreja presente no Concílio Vaticano II - uma Igreja cujos membros são todos discípulos de Jesus, com funções diversas, mas com igual dignidade e possibilidade de intervenção. Seria necessário prosseguir corajosamente esta linha de pensamento, em particular, reconhecendo a todas as mulheres e a todos os homens cristãos um papel activo na determinação das linhas de intervenção sócio-pastoral da Igreja, portanto, o direito a participar nas decisões tomadas no interior da comunidade, o que deveria levar à valorização e revitalização das estruturas de participação já existentes, bem como à possibilidade de criação de novas estruturas, se necessário. A participação de todos nas decisões que têm implicações para todos deveria dar lugar a uma reflexão sobre a possibilidade de equacionar determinados cargos e funções de uma forma não vitalícia, mais ágil, mais colegial, mais democrática.
Nota final continuo a alimentar o sonho de que os nossos filhos vejam uma Igreja na qual o ministério ordenado, em todos seus graus, seja partilhado igualmente por homens e mulheres.

sexta-feira, 15 de abril de 2005

"E se fosse o Dalai Lama?"
Esther Mucznik
(investigadora em assuntos judaicos )
Público, 15.4.2005

Pluralismo não significa relativismo. A presença livre, pública e aberta de vários cultos não apaga a realidade evidente da presença dominante de uma religião, neste caso a católica. A separação entre Estado e religião não nega esta realidade, e muito menos a cultura religiosa dominante
Será permitido a um representante de um Estado laico chamar "Sua Santidade" ao Papa João Paulo II, sem ofender a neutralidade religiosa do Estado? Ou, na mesma ordem de ideias, não constituem as bandeiras a meia haste e os dias de luto nacional pelo seu falecimento um atentado à laicidade, como foram qualificados por alguns sectores, em países como a França, Espanha e, mais timidamente, em Portugal? O "Verde" Christophe Girard, por exemplo, adjunto do "maire" de Paris, afirmou-se "perturbado" pela "utilização do símbolo nacional", abrindo assim a porta ao "aguçar dos apetites comunitários", no que foi apoiado pelo senador socialista Yves Contassot, apelando às autoridades a porem em prática uma "laicidade absolutamente sem sombra, sem meias-tintas". Também a TVE pública foi criticada por ter dado uma "cobertura excessiva" ao acontecimento, infringindo o artigo 16 da sua Constituição, que afirma o carácter laico do Estado espanhol. Curiosamente, constatamos que estas questões são levantadas sobretudo em países de população maioritariamente católica, em particular pela "filha mais velha" da Igreja, a França. Como se sabe foi também a França o motor da guerra contra a introdução da referência à "herança cristã" na Constituição europeia.Estes episódios não passariam de meros "faits divers" se não fossem reveladores de um mal-estar em relação à religião. A realidade é que a Europa, sobretudo a Europa Ocidental de cultura religiosa católica, convive mal com a religião, confunde as fronteiras da laicidade, mistura cultura religiosa dominante e religião oficial.Porque, o que significa, na boca dos seus defensores, uma "laicidade absolutamente sem sombra, nem meias-tintas"? Significa, em primeiro lugar, a erradicação total e absoluta, a "purificação", diria eu, de todos os actos e edifícios públicos e, já agora, da linguagem também, de toda e qualquer referência de carácter religioso. Mas, mais do que isso, a laicidade "sem meias tintas", propõe-se ignorar o fenómeno religioso, em qualquer das suas expressões, impedi-lo de se exprimir publicamente, encerrá-lo na esfera privada dos cidadãos. No limite, o Estado teria de banir os feriados religiosos cristãos, e obrigar os eleitos a praticar a auto-censura da sua linguagem pública, banindo por exemplo, o "se Deus quiser"... Ou seja tapar com o manto branco da neutralidade asséptica, qualquer indício de cultura religiosa. Ou retirá-la da vida, musealizando-a... Em relação ao falecimento do Papa, por exemplo, noticiá-la como mais uma notícia que apenas diz respeito ao foro privado dos católicos. Acontece, porém, que os católicos são 90 por cento desses países e, mais importante do que isso, a cultura religiosa católica e cristã é dominante, é o fundamento da sua história, das suas tradições, costumes e valores, do essencial da sua identidade. Negar esta realidade é destruir uma das principais bases da coesão social, um dos principais elementos de comunhão de origem, clamorosamente manifestada em Roma nos milhões de pessoas que aí acorreram ou que assistiram pela televisão à agonia do Papa.Por detrás desta crispação laica está no fundo a negação da religião, está a velha convicção que data do século XIX europeu, que para libertar as consciências era preciso recalcar a religião: a razão contra a fé. A primeira metade do século XX pareceu confirmar esta ideia. Exceptuando os Estados Unidos, a prática religiosa recuou em todo o mundo ocidental, as igrejas esvaziaram-se, as crenças e instituições religiosas desempenhavam um papel cada vez menor e marginal. Na cena pública, a ideologia tomou o lugar da religião. Governos, povos e movimentos sociais definiam-se em função das ideologias laicas: comunismo, liberalismo, fascismo...Mas no último quartel do século XX, a marcha em direcção à secularização inverteu-se. A religião ressurgiu em força e contrariamente às previsões, os seus adeptos não se encontram apenas nas pessoas de idade e entre os mais pobres, mas em todas as idades, sobretudo em jovens instruídos e com profissões de sucesso. A tendência inverteu-se: os ateus e os anti-clericais puros e duros encontram-se hoje nas gerações mais velhas, na geração das ideologias. Na Europa de Leste, a religião e a Igreja Católica foram os símbolos da resistência nacional e de luta pela liberdade; na Europa Ocidental, pelo contrário, religião e liberdade estiveram frequentemente em campos opostos. A laicidade, no ocidente europeu, nasce assim do conflito. Em muitas consciências permanece ainda a memória da ruptura violenta entre Estado e religião.Mas esta realidade não pode obscurecer duas questões essenciais:Em primeiro lugar, a laicidade não é uma doutrina (mais uma) dogmática e agressiva, mas sim a expressão de uma liberdade essencial, de um direito do homem e do cidadão. Não representa uma vingança histórica contra a Igreja Católica, mas sim o reconhecimento do pluralismo religioso e do direito inalienável individual e colectivo ao exercício livre e aberto da diferença religiosa. Não conduz o Estado a ignorar o fenómeno religioso, mas pelo contrário a reconhecer a sua função social permitindo e ajudando, não apenas um único culto mas todos, a cumprir essa função. Em segundo lugar, pluralismo não significa relativismo. A presença livre, pública e aberta de vários cultos não apaga a realidade evidente da presença dominante de uma religião, neste caso a católica. A separação entre estado e religião não nega esta realidade, e muito menos a cultura religiosa dominante. Porque uma religião representa muito mais do que um rito e uma prática ou até do que uma fé. Representa uma cultura no seu sentido mais lato, de costumes e tradições, mitos e memória, ética e valores, língua e linguagem, esquema mental e pensamento... em relação íntima com a história, a geografia e até o clima. Voltando ao princípio: não sendo católica, não me choca, não me incomoda que um estado laico, como o português, celebre luto nacional pelo chefe espiritual da Igreja Católica, neste caso o Papa João Paulo II. Não só pela sua estatura humana e espiritual, não só pela sua imensa obra de reconciliação entre as religiões, mas também porque reconheço que a cultura religiosa dominante em Portugal é a católica, é ela que tece as malhas do tecido social; e que a laicidade não consiste em fazer de conta que não é assim, como o querem fazer crer os argumentos do tipo "Se fosse o Dalai Lama...", mas em exigir o respeito escrupuloso pela independência religiosa do Estado de direito, assim como da liberdade de expressão e organização pública e privada das outras confissões religiosas.Quanto à expressão de Sua Santidade, lembro a todos os puristas que quando pronunciarem a palavra "Rabi" se estão a referir ao "meu" mestre...